Há tempos eu não assistia uma animação tão bacana que me fez assistir mais de sete vezes... em um prazo de duas semanas desde a estreia.
Encanto poderia ser apenas mais um desenho da Disney, com as
qualidades perfeitas sempre esperadas em cada um deles.
Não bastasse criar uma heroína latina, representando os
recônditos da Colômbia, eles ainda foram além e trouxeram uma das obras mais
fantásticas para análise da dinâmica familiar que muitos devem se identificar.
O desenho fala sobre tudo. Sobre matriarcado, sobre herança,
sobre dons que cada um tem a acrescentar dentro de um núcleo familiar.
Mas mostra o lado que muitas famílias tentam esconder
embaixo dos tapetes do esquecimento.
Veja aí se você identifica aquele membro da sua família que
é a peça mais forte, a que carrega o peso do mundo nos ombros, que serve como
burro de carga em muitos momentos. Sabe aquela pessoa que nunca diz não? E que
os outros fazem questão de pedir tudo, exatamente porque nunca receberão uma
negativa? A Luisa representa isso. Ela é a mais forte da família, mas em seu
momento mais vulnerável revela que o peso da cobrança tem sido demais para
aguentar. É muita pressão.
E aquela sempre perfeita e quase uma peça de decoração e
cartão de visitas da família? Isabela dá vida àquelas mulheres que são exigidas
a viver num padrão de perfeição, porque nada mais poderia ser esperado delas. A
beleza sendo enxergada somente naquilo que outros olhos consideram como belo.
Há beleza em outras coisas, como num cacto, e não apenas nas rosas que são símbolo
máximo de flor perfeita. E, mais uma vez, ela revela que age como a
‘perfeitinha’ apenas porque é isso que esperam, mas, na verdade, ela tem outros
sonhos guardados.
Vamos além em dizer que Isabela estava prestes a aceitar um compromisso com alguém, só porque era o que a família queria. Quantas pessoas se veem imersas em relacionamentos malfadados apenas por aparência, ou porque precisam dar satisfação aos pais o avós?
Temos aquela pessoa empática, que sempre se doa pelos
outros. Sabe a tia do chazinho? Você está doente, e ela faz questão de fazer
uma receita pra você melhorar. Ela te leva um bolo numa tarde chuvosa, porque acredita que isso vai te fazer. Um agrado e dose cavalar de carinho nunca são demais, não é? A Julieta, mãe da personagem principal dá vida a
isso.
Temos a tia dramática, que acredita que tudo é motivo de caos, tensão, choro e
drama. Muito drama. A famosa ‘tempestade num copo d’água’.
Tem o tiozão gaiato, sempre de bem com a vida.
Tem o primo fofo e maravilhoso. Antonio, seu lindo...
Tem o primo pentelho que gosta de imitar geral.
Tem o outro tio legal e que sempre apoia os outros, mas
normalmente fica nos bastidores e se levanta quando é preciso.
Tem a prima caladinha que tem o ouvido atento e sabe os
segredos da família. Podemos dizer que é o orelhão que passa o famoso 'telefone sem fio', inúmeras vezes, gerando confusão. Fui sutil em não chamar de fofoqueira, mas acho que todo mundo tem um membro desses na família.
Tem o tiozão considerado esquisito e fora do padrão
considerado ‘perfeito’ para integrar a família. E aqui nós falamos do Bruno,
sim. Ele é o cara que enxerga que há uma rachadura que pode ser criada na
família, caso as coisas não se resolvam. Ele é o cara que vê sua 'voz' sendo calada, porque o que ele diz pode romper o padrão perfeito que foi cultivado com tanto cuidado. Ele é o cara que é isolado, porque os membros consideram que se o que ele diz não for para somar, então é melhor subtraí-lo da equação.
Conhecemos inúmeros Brunos em nossas jornadas.
Tem a matriarca. Aquela que exige, cobra e que conduz todos
à mão de ferro. Nada pode sair daquilo que ela considera perfeito, e se não
sair, ela dá um jeitinho de ocultar por baixo dos panos, para que os outros não
vejam que há uma poeira na família exemplar. Por vezes, enxergamos apenas o lado rígido desta peça fundamental na família, e nos esquecemos de que há dores ali por trás também. E que essas dores a transformaram em quem ela se tornou.
E aí nós temos a personagem principal, que acaba sendo o elo
que une a família. Mirabel representa as pessoas que se sentem diferentes dos
seus, mas que tem, sim, muito a acrescentar, desde que seja dada uma
oportunidade para isso. Ela ama a família, mas como não tem um ‘dom’, um ‘talento’
especial, acaba sendo relegada a um papel insignificante dentro da dinâmica
familiar.
A Mirabel representa muitos de nós. Ela dá vida aos imperfeitos, aos diferentes, aos peculiares, aos singulares.
O nome Mirabel signifca maravilha, em espanhol. E sabe o que muita gente não costuma ver? Que todo mundo tem algo a acrescentar, algo maravilhoso e que pode ser único. Mas e daí se for diferente do padrão?
Mirabel é emoção pura. E é ela que mostra que não adianta tentar manter uma imagem, se ela se torna turva em muitos momentos. Não dá pra mostrar aos outros que ali é um lar de amor e dedicação, se a família abriu mão da presença de um dos seus.
O desenho aborda tantas nuances da dinâmica familiar, que aconselho assistir uma, duas, três vezes... E te desafio a se encontrar na fotografia. A se ver na imagem. Quem é você dentro da sua família?
E o que você pode fazer para encontrar o melhor de si dentro da sua dinâmica?
Seja Luisa, seja Isabela, seja Bruno... seja Mirabel. Acredito que se tivermos um pouquinho de cada um, como uma verdadeira receita de mistureba, nos tornaremos a nossa melhor versão.
Não é à toa que "Não falamos do Bruno" barrou "Let it Go", de Frozen, como a música mais baixada e ouvida dentre as animações Disney.
Eu, particularmente, amei a música da Mirabel, da Luisa e da Isabela. Há verdades expressas em cada estrofe que tocam bem fundo na alma.
Ah, sem esquecer a música "Ai, oruguita", cantada pelo Sebastian Yatra, que vai trazer uma lágrima ou duas ao olhos, associada com cena retrada em questão.
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